O legado Olímpico

No longínquo ano de 2005, concorriam com Londres o direito de sediar as Olimpíadas de 2012 Paris, New York, Moscou e Madrid.

Paris 2012
Paris 2012… perdeu, Monsieur

Não consigo imaginar quão terrível estaria a economia espanhola agora se, além de todos os problemas enfrentando a atual crise, eles ainda tivessem que se preparar para uma Olimpíada. A França, também tentando fugir de uma crise, está em um atual processo de reformulação política e é certamente melhor que politicagem e clima olímpico não se misturem. Os russos provavelmente gastaram todo o dinheiro do orçamento em vodka.

New York é um exemplo à parte. Ao perder o direito de sediar as Olimpíadas, a cidade pôde investir o dinheiro que seria gasto em estrutura de estádio e vila olímpica em coisas mais úteis e que os nova-iorquinos estavam realmente precisando, além de ter realmente cumprido boa parte da revitalização planejada se tivesse sido eleita. E, além de tudo, pôde fazer tudo com calma, tendo projetos de expansão do transporte público em andamento até 2014. Os ganhos para a cidade foram maiores do que se ela tivesse realmente sido escolhida para sediar os jogos – e é nisso que é baseado o título do artigo “How New York City won the Olympics”, de Mitchel Moss (novembro/2011) [link – pdf].

NYC – 2012

Mas Londres deu ao mundo uma olimpíada primorosa. A toda hora parecia que alguma coisa ia dar errado – e tudo beirou a perfeição. A rede de transportes foi impecável, a segurança foi constante e até o clima ajudou. O planejamento foi tão minucioso que deixa uma cidade sem elefantes brancos – grandes áreas foram revitalizadas e a Vila Olímpica foi propositalmente construída numa das regiões outrora mais pobres de Londres, Stratford (a meros quatro quilômetros aqui de casa); primeiro erro brasileiro, que está construindo sua Vila Olímpica na abastada região da Barra da Tijuca. O legado sustentável que as Olimpíadas deixam a Londres é inegável.

Com 29 ouros e a terceira colocação no quadro de medalhas, a Grã-Bretanha deixa também uma demonstração de força esportiva. Foi o melhor desempenho esportivo dos ingleses desde 1908, quando ganharam 56 ouros. Na ocasião, porém, era a primeira vez que Londres sediava os jogos e um terço dos atletas eram bretões. Nas Olimpíadas de Atlanta, em 1996, os ingleses voltaram apenas com uma medalha de ouro. Diante do choque, ao invés de chorar no facebook e culpar os atletas, o que se viu de lá pra cá foi um mastodôntico investimento em esportes, cujos resultados começam a ser colhidos agora.

Talvez a maior aquisição inglesa seja a alegria e euforia que tomaram conta da cidade no período olímpico. Nós, brasileiros, podemos nos preparar para um entusiasmo semelhante já daqui a dois anos. Ao contrário do que pregam os economistas do COI e da Fifa, um país que sedia uma Olimpíada ou Copa não tem nenhum ganho econômico – muito pelo contrário – mas seu povo fica indubitavelmente mais feliz. – (http://super.abril.com.br/esporte/copa-deixa-voce-mais-pobre-mais-feliz-573075.shtml)

Esse “Feel-Good Factor”, como é chamado por aqui, ajudou até a diminuir o crime. A maioria das prisões no período dos jogos foi por conta de cambistas ou pessoas tentando revender os ingressos depois de suas seleções terem sido desclassificadas – considerado um crime olímpico. A maioria das pessoas era simplesmente alertada que era crime, multada e liberada, mas mesmo assim, houveram 151 prisões por revenda de tickets. Além de 21 prisões por porte ou tráfico de drogas, 16 por assaltos, 11 por roubos, uma por falsa ameaça de bomba e uma por nadar no Tâmisa.

Os tickets foram certamente o principal problema das Olimpíadas. Era impossível comprá-los, pois a maioria dos eventos constavam como “esgotado”, o que tornava revoltante ver pela TV a infinidade de assentos vagos em cada partida. São lugares reservados para a família olímpica, que apesar de ter dinheiro para patrocinar o evento, não são lá muito ligados em esporte. É um problema que se repete desde as Olimpíadas de Beijing, em 2008, e pelo que eu conheço de política brasileira, vai só piorar no Rio em 2016. (link: http://www.hortifruti.org/2012/08/04/primos-pobres/)

Mas no geral, as Olimpíadas foram excelentes e eu estou muito feliz de poder ter estado aqui durante o período. Londres sofre agora de uma depressão pós-olímpica, aquele tipo de sentimento que nós brasileiros temos quando voltamos de uma viagem de carnaval particularmente excelente. Já na manhã de segunda-feira, horas depois da cerimônia de encerramento, o céu amanheceu nublado, tipicamente londrino. Depois de 16 lindos dias de sol quase constante, a cidade volta a abrir seus guarda-chuvas e as pessoas voltam a ir aos seus trabalhos sem os voluntários de camisas roxas esbravejando “bom-dias” ao povo.

Placa colocada na estação Stratford, indicando o caminho para 2016

2016 está chegando e o Rio de Janeiro é logo ali. Agora é nossa vez.

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