O Escritório

Este texto não é meu. É um espaço que eu gostaria de ceder para diversos autores que considero sensacionais compartilharem também suas próprias babaquices.
Andrey é o vilão especialmente convidado da vez.

Milhões e milhões de pessoas ao redor do mundo sabem o que é trabalhar todos os dias em um escritório. O resto, incluindo limpadores de chaminés, especialistas anti-bombas e jogadores do palmeiras, têm sorte.

Não que seja ruim passar mais de 45 horas semanais dentro de uma sala climatizada, encarpetada, com cafézinho à vontade, banheiros disponíveis, horário para refeições e pessoas de todos os tipos convivendo juntas. O único problema é que eu, pessoalmente, preferia ter meu corpo beliscado por mil siris malvados à isso.

Dwight Schrute
Segunda-feira?

Ainda não encontrei os mil siris malvados, portanto sim, eu trabalho em um escritório.

Abaixo uma descrição simples de alguns aspectos da infra-estrutura desse ambiente de trabalho. Apenas como uma referência para quem ainda não é climatizado com as maravilhas de um escritório.

Trabalho ao ar preso

Já que toquei no assunto, porque não falar dos tais sistemas climatizados? Parece uma benção trabalhar em um ambiente em que a temperatura está perfeitamente regulada para que meu corpo possa manter suas funções vitais, enzimas trabalhando perfeitamente, glândulas sudoríparas em estado sonolento, além de sentir uma sensação agradável durante todo dia, não importa a estação do ano. Bom, sim, isso é uma benção, de fato. O que ficou de fora dessa linda história é que esses tais sistemas devem ter sido feitos nos anos 30, quando ainda não existia esse tal de Aquecimento Global. É impressionante perceber que no inverno, o ar-condicionado funciona perfeitamente, exigindo o uso de blusas e cachecóis em plena “Reunião Mensal de Desempenho”, enquanto no verão há revolta e piquetes contra o Zé, que explica que nada pode fazer, pois o ar condicionado já “está no último”.

Além do mais, quando falamos de uma temperatura agradável a que temperatura você se refere? Como disse inicialmente, o escritório é uma amostra de todos os tipos de pessoas, temos então desde esquimós calorentos até beduínos friorentos. Certamente ainda haverá a “Rebelião dos Cubículos” por questões climáticas, aonde haverá morte e raiva recíproca.

O último ponto, ao se falar do áquario humano que é o escritório é que, se as pessoas não chegam a um consenso em relação à temperatura, então ao menos em outros aspectos elas dividem como irmãs o seu dia-a-dia. Gripes, resfriados, viroses e doenças mil convivem perfeitamente entre os seres humanos, viajando de baia em baia pelo complexo sistema de túneis de ar-condicionado que isola a todos do mundo exterior.

O piso

Vamos falar agora do piso. Segundo estudos 98% dos escritórios padrão, no mundo, usam carpete, outro 1% está em reformas para colocação de carpete e o último 1% é muito pequeno pra comprar carpete, mas tem projetos para tal. Tirando algumas exceções raras basicamente todo o carpete usado em escritório vem de duas fontes: Couro de Rato ou Sobrancelhas.

Esse material não foi escolhido por mero acaso ou algo como “Diminuição dos Custos de Infra-Estrutura”. Na verdade, depois de muitos estudos descobriu-se que tanto couro de rato quanto sobrancelhas detém qualidades quimicas que matam praticamente qualquer germe e ácaro existentes na natureza. O problema é que, novamente, esses testes foram feitos provavelmente nos anos 30, e toda a sorte de criaturas já criou resitência suficiente para povoarem os escritórios de todo o mundo. Novos testes não são feitos pois para isso teriam de ser usados animais como cobaias em ambientes simulando escritórios, mas a Associação em Defesa dos Animais não permitiu a crueldade.

Mobiliário

Eu poderia definir o mobiliário do escritório padrão como tacanho. Mas pela experiência, e inclusive por já ter participado da aquisição desse tipo de bens eu chego à conclusão que na verdade ele é sádico.

Em um primeiro olhar você pode achar normal todos os móveis e equipamentos utilizados nesses ambientes, mas isso apenas por você estar totalmente acostumado a eles. É como aqueles vídeos que mostram as ruas de cidades grandes da Índia, você fica assustado com o absurdo fluxo de veiculos, mas para eles isso é corriqueiro. Ou ainda para você que mora em São Paulo e acha normal a cidade alagar um pouquinho (2 metros) todo ano.

Basicamente se você apresentasse a sua firma para um aborígene, por exemplo, ele não tomaria diferenças entre ela, um ferro velho e o set de filmagens de “Jogos Mortais” (se você esta achando que eu exagerei, você está certo, mas pergunte-se se eu exagerei tanto assim).

De fato, a configuração em que mesas e monitores são colocados auxiliam para que você nunca saiba o que vem por trás, criando medo na maior parte do dia. As empresas que produzem mobiliário de escritório especializaram-se nessa técnica de forma que: ou seu chefe sempre pode chegar de surpresa, ou você nunca sabe se alguém está olhando o que você está fazendo. Se não é assim no seu local de trabalho saia já desta empresa, eles não são organizados o bastante.

Being Monitored
You are being monitored

O material utilizado em mesas, por exemplo, é rídiculo. Atualmente sento-me em uma mesa que se esfacela quando cruzo as pernas batendo o sapato nela. As gavetas estão soltas, tenho de utilizar pilhas de papel para apoiar o monitor e não tenho espaço suficiente para trabalhar mesmo desconfiando que sofro de nanismo. A cadeira geralmente é caso de polícia e de processos tortuosos na justiça, devido a edemas permanentes na coluna e tendões. Existe, em todo escritório, uma guerra velada e fria, aonde cada um luta diariamente para arranjar uma cadeira melhor, não importando se é seu amigo de 15 anos de empresa ou a gostosinha do RH.

Às vezes, sou levado a pensar que as empresas têm uma área escondida destinada a controlar o bem-estar dos funcionários. Nessa área, especialistas analisam o grau de felicidade de cada um. Quando o colaborador está muito feliz os especialistas vão, durante a noite, quebrar uma rodinha de sua cadeira, ou soltar um parafuso para que o encosto do braço não pare de cair. Afinal ninguém pode demonstrar muita alegria, ou criam-se tensões entre funcionários menos felizes.

Em casos de funcionários muito, muito insatisfeitos os mesmos especialistas sabotam as cadeiras de forma fria, para que quando o infeliz em questão se sobressaltar, seja por receber uma bronca, por ver seu olherite ou por ter de refazer parte do projeto, a cadeira desmonte de forma que o coitado sofra uma queda espetacular, tirando assim qualquer pensamento malévolo do mesmo contra a empresa e fazendo com que ele foque sua raiva na cadeira.

Os computadores e equipamentos eletrônicos provêm de escambo com repartições públicas extintas da Era Vargas. Em pouquíssimas exceções os equipamentos são verdadeiramente de última geração, mas quando assim é, certamente ele será guardado em um depósito pelo pessoal de TI até que sua qualidade torne-se “aceitável” pela área responsável pela sabotagem de cadeiras.

Para finalizar com a mobília, faço duas perguntas: Porque as cores têm de ser aquela aparência de branco sujo? Tudo, computadores, divisórias, paredes e até lâmpadas têm uma coloração meio nauseante, que você não escolheria nem para banheiros de sanatórios. É pura malícia dos empregadores?

Office Space
Quem nunca sonhou com isso?

Banheiros e Café

Falarei de ambos no mesmo tópico porque não existe realmente muita diferença entre os ambientes: Em um o pessoal faz merda e no outro o pessoal fala merda. Além de que a qualidade do café, se razoável, equipara-se a água suja (não, eu nunca pensaria em urina).

Nas empresas menores, bem pequenas e que nem carpete tem, geralmente o café é feito pela Maria. Essas empresas são abençoadas por um café bastante bom. Nas empresas maiores, no entanto, existem as maravilhosas máquinas de café. Sua máquina de café terá uma aparência importada, de preferência italiana, e será toda automatizada, é só apertar um botão e você terá um capuccino, um café com leite, leite, chá e chocolate.

No entanto, sou Engenheiro Mecatrônico. Eu e meus pares somos responsáveis pela criação da tecnologia de automação necessária para a montagem e programação de uma dessas máquinas. Acontece que Engenheiros não fazem café. Duvido que um Engenheiro ao menos saiba do que é feito capuccino (alguém sabe?). Se você entendeu minha lógica saberá que o café resultante da Engenharia dessas máquinas é equiparado a lodo, ou ainda equiparado ao café raro e caro que provém do cocô daqueles esquilinhos lá do Oriente, mas sem os grãos de café no bolo fecal.

O banheiro é um caso a parte. Se você é mulher, talvez não queira ler este parágrafo, pois falarei exclusivamente do que conheço, ou seja, banheiros masculinos. Reafirmo, sou Engenheiro. Você sabe quantos homens trabalham em uma empresa de Engenharia? Aliás, tem ideia de que tipo de pessoas trabalham aqui? Basicamente todo Engenheiro ou Técnico, se não atuasse na área, seria, pelo porte e costumes, uma dentre as seguintes: caminhoneiro, lutador de vale-tudo, operador de máquinas pesadas, carregador portuário, bailarina ou escritor.

Sendo assim, imagine você, num local com mais de 100 homens como imaginados acima e apenas quatro “casinhas” para necessidades. O fluxo de dejetos é abismal. São utilizados frascos e frascos de bom ar e mesmo assim a melhora é irrisória. Agora imagine isso na “quarta-feira da feijuca & caipirinha” e tenha seus pesadelos multiplicados. Sei que trabalhar aqui ajudou e muito a minha capacidade de manter-me vivo sem respirar.

Continuação (Refeições, Internet & email, Você no trabalho, Seu Chefe, As pessoas do escritório e mais).

Vilão especialmente convidado:
Andrey Mattos Machado

Andrey Mattos Machado

Andrey é um grande amigo e uma mente engraçadamente excepcional. É engenheiro e uma das tristes exceções originais.
Tem um olhar apurado sobre as coisas.
Ele não tem twitter.